CRÍTICA | Gladiador II: quem tem boca "vaia" Roma
- João Moura
- 14 de nov. de 2024
- 3 min de leitura
Atualizado: 12 de fev.
(ESSE TEXTO CONTÉM SPOILERS!!!)

Com um elenco carregado de estrelas da antiga e da nova geração e uma produção milionária (310 milhões de dólares, de acordo com o The Hollywood Reporter), Gladiador II satisfaz, mas não traz praticamente nada de novo. As longas duas horas e trinta minutos do filme exibem uma trilha sonora épica e uma fotografia digna da Roma Antiga. Com direito a babuínos famintos, um rinoceronte selvagem e, como se não bastasse, tubarões em pleno Coliseu, as cenas de ação não decepcionam. No entanto, senão pela atuação brilhante de Denzel Washington como Macrinus, o proprietário de escravos, a sequência apenas repete a dose.

Mãos fortes e pesadas trabalham a terra com movimentos delicados, assim como, em Gladiador, os dedos calejados de Maximus (Russell Crowe) deslizam pelo campo de trigo dourado. Dessa forma, logo na primeira cena, Ridley Scott escancara o paralelismo entre suas duas obras, e começa a dar pistas do que está por vir. O quadro se abre para revelar o semblante atento de Hanno (Paul Mescal), um destemido guerreiro da Numídia, movido pelo ódio ao exército romano e pelo amor à sua esposa Arishat (Yuval Gonen). Após um violento ataque naval contra a Numídia, Arishat é assassinada por ordem do general romano Acacius (Pedro Pascal), enquanto Hanno é feito prisioneiro por um contrabandista de gladiadores escravizados. E, nesse momento, dá-se início ao ciclo de vingança do nosso protagonista. Te lembrou alguma coisa? Pois é.

Não demora muito para o bárbaro deixar transparecer seus conhecimentos sobre a cidade de Roma e o grande império, além, é claro, de sua notável habilidade com a espada. Desde a sua aparência até a forma como se porta e se expressa, Hanno traz características marcantes de Maximus. O jovem soldado conclui o primeiro ato revelando sua verdadeira identidade: Lucius, filho de Lucilla (Connie Nielsen) e do lendário gladiador. A reviravolta dá a entender que o roteiro de David Scarpa e Peter Craig apenas aproveitou a brecha deixada pelo primeiro filme – um possível romance entre Maximus e a filha do imperador Marcus Aurelius, que nunca foi, de fato, explicitado – para dar continuidade à história.

A relação parental construída não é o problema, mas sim a repetição. Lucius e seu pai vivem o mesmo arco: das batalhas de esquina ao Coliseu, do prisioneiro anônimo ao herói de Roma, até o momento em que suas vinganças são concretizadas. O grande ponto de divergência está no personagem que, inicialmente, apresenta-se como secundário, para, então, tomar todo o antagonismo para si. Diferente de Proximo (Oliver Reed), o dono de escravos em Gladiador, Macrinus determina o ritmo da narrativa. A aparência exuberante e carismática, a postura dominante e o tom sarcástico desempenhados pela performance de Denzel Washington fazem com que o caçador de gladiadores transborde personalidade. Macrinus manipula tudo e a todos ao seu favor, e sua sede insaciável por poder o leva até o Senado. Os irmãos Geta (Joseph Quinn) e Caracalla (Fred Hechinger), atuais imperadores, são ingenuamente seduzidos pelo magnata e não tardam a cair. Pode-se dizer, inclusive, que a dupla ilustra uma versão caricata do lado sádico, sombrio e infantilizado de Commodus (Joaquin Phoenix), da obra anterior. A insanidade e a carência conduzem os gêmeos à própria ruína. Se comparado a Macrinus, o par não tem influência alguma no desdobramento dos eventos.

A abordagem mais filosófica e profunda do filme antecessor, em geral, é deixada de lado. Apesar de constantemente mencionadas, as virtudes defendidas por Marcus Aurelius (Richard Harris) são pouco praticadas pelos heróis da trama; o sangue jorrando e as cabeças rolando importam muito mais, pelo visto. O terceiro ato é encerrado com um discurso glorioso e um desfecho previsível. Mas, de todo jeito, a quantidade de referências é suficiente para tocar os corações dos saudosos e fanáticos pelo clássico geracional de Scott. A produção poderia muito mais em termos de criatividade e inovação, mas com certeza atende ao seu público.
Nota: 3,5/5
Comments