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O Portal do ParaĆ­so: como Michael Cimino acabou com a Nova Hollywood

Atualizado: 29 de mar.


O movimento da Nova Hollywood, que floresceu entre o final da dĆ©cada de 1960 e o inĆ­cio dos anos 1980, foi um perĆ­odo revolucionĆ”rio na histĆ³ria do cinema americano. Impulsionado por jovens cineastas que buscavam romper com as convenƧƵes do sistema de estĆŗdio clĆ”ssico, esse movimento deu origem a um perĆ­odo onde obras autorais tinham confianƧa dos estĆŗdios e conseguiam investimento mais facilmente, como Apocalypse Now (1979), de Francis Ford Coppola, um dos primeiros blockbusters autorais jĆ” realizados. No entanto, essa era de liberdade criativa encontrou seu fim em um fracasso estrondoso: O Portal do ParaĆ­so (1980), dirigido por Michael Cimino.


O cineasta havia conquistado aclamaĆ§Ć£o com o filme O Franco-Atirador (1978), que venceu o Oscar de Melhor Filme e solidificou sua posiĆ§Ć£o como um dos principais nomes do perĆ­odo. Embalado por esse sucesso, Cimino recebeu carta branca da United Artists para realizar O Portal do ParaĆ­so, um Ć©pico de trĆŖs horas e meia que retrata um conflito violento entre imigrantes europeus e grandes fazendeiros no final do sĆ©culo XIX.


Desde o inĆ­cio, a produĆ§Ć£o de O Portal do ParaĆ­so foi marcada por excessos. O orƧamento inicial, estimado em US$ 11 milhƵes, mais que triplicou durante as filmagens, chegando a US$ 44 milhƵes ā€” um valor exorbitante para a Ć©poca. Cimino frequentemente refazia cenas diversas vezes, exigindo um controle minucioso sobre todos os aspectos da produĆ§Ć£o. Esses atrasos e gastos desenfreados transformaram o projeto em um verdadeiro caos logĆ­stico e financeiro.


ReproduĆ§Ć£o/United Artists
ReproduĆ§Ć£o/United Artists

Quando finalmente foi lanƧado, O Portal do ParaĆ­so foi massacrado pela crĆ­tica e fracassou nas bilheterias, arrecadando menos de US$ 4 milhƵes. O desastre foi tĆ£o significativo que levou a United Artists Ć  beira da falĆŖncia, sendo posteriormente vendida para a MGM. Mais do que um prejuĆ­zo financeiro, o filme simbolizou a perda de confianƧa dos estĆŗdios nos cineastas da Nova Hollywood.


A partir desse momento, a indĆŗstria cinematogrĆ”fica americana passou a priorizar o controle criativo dos estĆŗdio em detrimento da liberdade autoral. Filmes de orƧamento elevado passaram a ser supervisionados com rigor e as superproduƧƵes voltaram a ser planejadas com foco no apelo comercial, resultando no domĆ­nio do produtor sobre as produƧƵes mais caras. O fracasso de O Portal do ParaĆ­so nĆ£o apenas encerrou a era de liberdade da Nova Hollywood, mas tambĆ©m pavimentou o caminho para uma nova abordagem empresarial no cinema.


Uma Obra Reavaliada


Embora tenha sido reavaliado ao longo dos anos e recebido apreciaĆ§Ć£o posterior como uma obra ambiciosa e visualmente deslumbrante, O Portal do ParaĆ­so Ć© muito mais do que um estudo de excessos ou um exemplo do embate entre arte e negĆ³cios. O filme de Cimino se destaca pela habilidade em conciliar a grandiosidade de um Ć©pico western com momentos de profunda humanidade. As relaƧƵes entre os personagens sĆ£o construĆ­das com sinceridade, pontuadas por gestos singelos que dĆ£o ao filme uma dimensĆ£o emocional singular.


ReproduĆ§Ć£o/United Artists
ReproduĆ§Ć£o/United Artists

O final, marcado por uma batalha crua e visceral, Ć© um dos momentos mais impactantes de Cimino enquanto cineasta, demonstrando a destreza em capturar tanto a brutalidade da violĆŖncia quanto as consequĆŖncias devastadoras para seus personagens. Esses elementos fizeram com que O Portal do ParaĆ­so se tornasse um clĆ”ssico, celebrado por aqueles que reconhecem sua ousadia e profundidade de sua narrativa.


Mais do que um fracasso isolado, O Portal do ParaĆ­so permanece como um lembrete das tensƵes entre arte e negĆ³cios no cinema. E, para muitos, Ć© tambĆ©m o Ćŗltimo grande suspiro da liberdade criativa que definiu a Nova Hollywood.




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