Crítica | Rivais: O jogo de desejo e poder de Zendaya
- Marina Branco
- 25 de abr. de 2024
- 6 min de leitura
Atualizado: 8 de jun. de 2024

“Tênis não é um jogo. É um relacionamento.” Não existe frase que melhor define o longa "Rivais”, protagonizado por Zendaya, Josh O’Connor e Mike Faist do que a dita pela própria personagem principal. Construído em torno de uma única partida que é ao mesmo tempo, a primeira e a última cena do filme, a história contada é a de um triângulo que está mais para odioso do que amoroso, vivido dentro das quadras de tênis.
Em uma mistura de comédia, pressão, drama, tensão, romance e uma sensualidade mais que presente, o filme dirigido por Luca Guadagnino acompanha a trajetória de três esportistas que têm suas vidas entrelaçadas tanto nas quadras, quanto no amor. Desde os tempos de faculdade, Art Donaldson (Mike Faist) e Patrick Zweig (Josh O’Connor) são melhores amigos e uma dupla de tênis memorável, que ficou conhecida como “Gelo e Fogo”. Tudo muda com a chegada de Tashi Duncan (Zendaya) - a clássica adolescente que para todos os olhares ao passar. Com um ar de melhor tenista do mundo e uma sensualidade que atrai os dois imediatamente, Tashi torna as disputas de jogo entre os meninos em uma grande disputa por ela mesma, que se estende por anos a fio.
O trio é, mais que tudo, hipnotizante. Cada um à sua maneira, os personagens prendem a atenção do público, seja pela identificação com as fraquezas de Art, pelo estilo bad boy de Patrick, ou pelo sex appeal imenso de Tashi. Juntos, os três criam com sucesso um dos poucos casos onde é difícil torcer para alguém na história, porque a sensação passada é de que todos são vilões. Fazendo tudo para conquistar mais um jogo, mais um campeonato, ou um ao outro, a tensão entre os protagonistas é quase palpável, tanto na competição, quanto nas crises de vida adulta que impedem que Rivais seja mais um filme adolescente café com leite.

Reprodução: Warner Bros. Entertainment
E no meio de tudo, não falta o foco principal do filme, como Tashi sempre volta a reforçar - o tênis. Até mesmo na construção do roteiro, a sensação é de que tudo é uma grande partida de tênis onde a bola é levada de um lado para o outro nos intermináveis saltos temporais que picotam a história em várias partes - mas de um jeito que, por mérito de uma construção de roteiro impressionante de Justin Kuritzkes, permite que quem assiste entenda o que está acontecendo com o nível exatamente necessário de informação a todo momento.
Apesar disso, é impossível não notar um exagero na quantidade de saltos que, por terem espaços de tempo diferentes entre si, tornam a construção confusa à medida que o longa avança. A produção de Rivais também acerta muito na passagem da vida dos personagens: com cortes de cabelo e vestuário, o filme transmite claramente as diferentes idades de cada ator, que vão de adolescentes até pai e mãe.
O Matchpoint

Reprodução: Warner Bros. Entertainment
O clímax do enredo é construído a partir de uma única partida de tênis, que norteia a história inteira. Isso porque a ideia para o roteiro de Rivais surgiu quando o escritor assistia à final do campeonato US Open de 2018, onde Serena Williams foi acusada de receber ajuda técnica externa, e criou uma situação digna de filme em quadra ao tentar se defender de ataques pessoais. Inspirado, o roteirista intercalou cenas da vida dos personagens ao longo dos sets da partida final, explicando aos poucos tudo que os levou até a emoção presente ali.
E falando na partida final, é impossível não reconhecer o trabalho cinematográfico absurdo criado nela ao longo dos oito dias de gravação. Com um jogo de câmera que faz com que o espectador se sinta dentro de quadra, indo de um lado a outro junto com a bola, a fotografia de Sayombhu Mukdeeprom cria uma atmosfera de tensão frenética até a chegada do matchpoint. Para isso, ele tem a ajuda também de uma trilha sonora impecável, que transmite a fundo todo o clima de um campeonato de tênis, e parece colocar a competição no coração de quem assiste.
E para os brasileiros, tem uma surpresinha nas músicas do filme! Em uma das poucas cenas com trilha sonora não instrumental, a voz que canta a história é a de Caetano Veloso, com uma de suas músicas em espanhol!
As Raquetes
Se o filme é um relacionamento de tênis, Art e Patrick são as raquetes. De lados opostos da trama, os personagens travam disputas hipnotizantes, com uma química que claramente funciona muito bem. Indo de melhores amigos para parte do trio onde todos parecem ser verdadeiros rivais, os atores provam serem bons em interações nos dois cenários, divertindo o público, disputando a atenção de Tash, e trazendo identificações das pressões comuns da vida.

Reprodução: Warner Bros. Entertainment
Enquanto O’Connor, ator muito lembrado por sua performance em The Crown, representa um fracassado, sem talento ou mesmo dinheiro para se sustentar, Faist, do romance Amor, Sublime Amor, é um jovem de sucesso, mas que não suporta a pressão colocada sobre si. O filme é repleto de frustrações para os personagens, deixando o público sempre na expectativa de um romance que, na realidade deles, é irreal. O interesse dos protagonistas uns nos outros é puramente competitivo, sendo a vitória o principal fator para definir se um casal continua ou não junto. Donaldson parece, de certa forma, ser o único que busca um amor além do jogo, o que pode vir a amolecer o coração do espectador - mas não o torna um bom moço.
A dupla, tão parecida mas também tão oposta, se reencontra em um campeonato no momento de maior fraqueza de Art, gerando cenas que relembram os tempos e disputas de adolescência com força total. E aqui, Rivais usa e abusa do simbolismo com muito sucesso, se comunicando com o público não só por meio das palavras, mas também pelas memórias dos tempos de amizade dos dois, incluindo significados subliminares que fazem quem assiste se sentir integrante da relação.
A Bola
A partida de tênis gira sempre em torno da bola - e aqui, a bola não poderia ser outra que não a Zendaya, talvez até mais do que sua personagem. Tashi Duncan, tenista infalível e apaixonante, conquista todos nas arquibancadas e age do início ao fim do filme como a grande dona da história, insistindo em “coadjuvar” os outros dois. Com uma presença quase ininterrupta, a imprevisibilidade da personagem prende tanto os interesses amorosos, quanto os espectadores do filme em cada passo seu.
E a verdade é que ao assistir Rivais, fica claro que o papel não poderia ter sido feito por ninguém além de Zendaya. A atriz que surgiu no mundo de filmes de Disney e heróis vem mudando a premissa de seus trabalhos, alcançando um público mais adulto já em Euphoria e Duna. Mas em Rivais, surge uma Zendaya adulta consolidada, que toma para si um roteiro como os clássicos de ensino médio que é acostumada a fazer, e o encara como um conteúdo maduro e adulto.

Reprodução: Warner Bros. Entertainment
É impossível negar que a linha que rege a personagem de Zendaya no longa é a sensualidade. Apesar de não incluir cenas explícitas, os momentos da personagem com seus parceiros são definitivamente cenas que o Tom Holland não deveria ver. Os takes são repletos de um erotismo pulsante desde o trailer, que já anuncia o que está por vir em um beijo triplo dos protagonistas. Usando o sexo como grande sustentador do poder imparável que a personagem tem, a atriz prende todos os olhares em uma Zendaya adulta, desejável e poderosa.
Mas não é o sex appeal a única característica que torna Tashi a personagem perfeita para moldar a história. Enquanto todas as reviravoltas no triângulo amoroso parecem partir de decisões dela, a frustração do único acontecimento que não foi proposital também rege a trama. A partir da lesão que faz com que Tashi deixe de ser atleta e garante uma cena angustiante ao longa, Zendaya passa ao público toda a frustração de ver seus sonhos perdidos, interrompendo bruscamente a trajetória que tanto prometia para o enredo - assim como é feito o desfecho final do filme. Com isso, a personagem passa a vivê-los através de outra pessoa, e se torna uma treinadora do esporte. Construindo uma personagem complexa, a protagonista aparenta fazer de tudo para que Art seja campeão, colocando a vitória acima até mesmo do relacionamento dos dois. Apesar disso, a sensação que fica é de que ela nunca deixa de competir com ele, sempre se colocando como superior a todos.

Reprodução: Warner Bros. Entertainment
Rivais é, acima de tudo, um filme da Zendaya. Colocando a atriz, e também produtora, no centro de tudo, a trama abriu espaço para que um novo tipo de atuação fosse construído, dando um “spoiler” do que podemos esperar da Zendaya adulta, já longe dos filmes infantis. A atuação dela, ao longo de todas as cenas, é irretocável. Arrancando risadas em suas cenas de deboche, acelerando corações nas cenas de tensão e dominando as cenas sensuais, ela transmite com clareza quem é Tashi Duncan, dentro de todas as nuances que a compõem.
Os Pontos
Se a intenção era provar que o tênis é um esporte de relacionamentos, Rivais conseguiu com muito sucesso. Em uma trama envolvente e quase que frenética, o roteiro comum de disputa por amor toma uma forma adulta e tensionada, que encanta quem assiste tanto pelo esporte, quanto pela história.
Nota: 4,5/5 🎾
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