Bastidores de Star Wars: O que é a Genialidade de George Lucas?
- Vinícius Nocera
- 3 de mai. de 2024
- 5 min de leitura
Atualizado: 8 de jun. de 2024

Star Wars é um fenômeno que está presente na cultura pop há quase 50 anos. Seu criador, George Lucas, é considerado um gênio da indústria por ser a grande mente por trás de uma obra que revolucionou diversas vezes o gênero de ficção científica. Mas o que seria essa genialidade de George Lucas? Eu tentarei transmitir minhas reflexões sobre o assunto a partir desse texto.
O Mito do Gênio Solitário

Desde os tempos antigos, a humanidade sempre teve seus gênios de bolso. Seres iluminados diferentes do povo comum, aqueles abençoados com o talento natural, seja artístico ou científico, eles eram pessoas capazes de inovar e criar obras-primas sozinhos que nenhuma outra pessoa poderia.
Mas será mesmo?
A verdade é que o mito do gênio solitário, nome dado a esse fenômeno social, é uma falácia. Claro que existem pessoas talentosas no mundo, até pessoas que conseguem produzir algo artístico de forma independente, eu não estou aqui para discutir isso. O fato é, principalmente nos tempos atuais, para se produzir uma obra de expressão artística, geralmente é necessário mais do que apenas o suposto gênio sozinho.
Essas pessoas, porém, muitas vezes não são sequer creditadas como criadoras da obra em si. Editores em filmes, função normalmente ocupada por mulheres, tem uma importância fundamental na pós-produção para literalmente dar sentido às várias horas filmadas sem nexo estabelecido. Michelangelo nunca conseguiria terminar a Capela Sistina sem outros artistas, que também estavam trabalhando lá.
Mas o que faz com que a humanidade apague essas pessoas tão importantes para a criação da arte?
“Artesãos, não artistas”
Historicamente, existe uma divisão entre o artista e o artesão. Isso vem historicamente de uma ótica elitista, de que aqueles que “são criativos” e estão em uma posição de suposta autoria são os verdadeiros artistas, e aqueles que “apenas executam” o trabalho necessário para realizar a ideia são artesõesé um artesão. Parecido com a diferença de um arquiteto para um engenheiro, um é vangloriado na sociedade e o outro é tratado como apenas o executor. Porém, seguindo essa terminologia estabelecida pelo sistema capitalista, o artesão é tão importante para a obra quanto o artista. Para evidenciar isso, irei citar o filme soviético “Um Homem com uma Câmera” (1929).

O filme é um experimento cinematográfico, com o intuito de afirmar o poder do cinema como arte independente da literatura e do teatro. Em um resumo, o filme é basicamente um homem com uma câmera filmando cenários na União Soviética no final da década de 20. Ou seja, muitas horas de conteúdo aleatório sendo filmado de forma totalmente desorganizada e sem nenhuma ideia de coerência.
Porém, a partir da própria dialética do filme, é evidenciada a figura da montadora, que aparece tanto a partir da coerência da montagem realizada, como também fisicamente, o filme dedica sempre alguns momentos para evidenciar como o trabalho da pessoa que “põe a mão na massa” é extremamente necessário para que ele consiga existir. Além de discutir uma questão de gênero, por ser uma função comumente ocupada por mulheres, é uma questão de evidenciar o caráter de autoria do tal artesão. O artesão é um artista tal qual o artista é um artesão, e esses são termos idiotas criados por uma vertente imbecil da arte, que vangloria um suposto intelectualismo totalmente contraditório, como evidenciado neste texto.
Dito isso, a existência de pessoas que fazem artes inovadoras sozinhas continua existindo, como Van Gogh. Porém, além de variar de arte para arte, pois uma coisa é fazer um quadro sozinho, a outra é a criação de um filme sozinho, o melhor caminho é a colaboração entre pessoas. Cada pessoa tem uma afinidade com algum tipo de área, então é muito mais inteligente e prático juntar pessoas que são bons em sua área para criar algo, ao invés de tentar criar tudo sozinho. Isso me lembra, esse texto era sobre George Lucas.
A genialidade de George Lucas
George Lucas é um gênio, isso é praticamente indiscutível. Porém, ele não é um gênio por ter criadocriar e bolado Star Wars sozinho ou qualquer outra falácia que tentem empurrar. A questão é justamente o contrário. George Lucas é um gênio por ser um dos melhores colaboradores da indústria de cultura pop.
O criador de Star Wars é bom em achar justamente a pessoa que é melhor para cada função em seu filme.

Existem os exemplos mais celebrados publicamente, como a entrega do seu segundo filme da franquia Star Wars para o seu professor de cinema, pessoa que George Lucas admirava. O resultado foi que Irvin Kershner criou O Império Contra-Ataca (1980), considerado por muitos o melhor filme da franquia.
George Lucas cedeu o lugar para seu professor após já ter dirigido o primeiro filme da franquia e ter sido um sucesso, por reconhecer que ele seria mais adequado para a função do que ele. Mesmo não tendo essa mesma humildade nos prequels da franquia, é possível ver de forma expressiva como Lucas tem uma boa noção da função de cada um.
Trazendo de volta o exemplo das montadoras e editoras, a ex-mulher de George Lucas foi essencial para a edição dos 3 primeiros filmes da saga. Maria Lucas chegou a vencer um Oscar por seu trabalho primoroso nos longas.
Lucas fundou sua empresa de efeitos visuais para a criação de Star Wars, a Industrial Light & Magic. Para conseguir inovar da forma que queria, ele procurou profissionais que haviam trabalhado em outra obra revolucionária da ficção científica, os artistas de 2001: Uma Odisseia no Espaço. A partir de indicação de um dos artistas que trabalhou no filme do Kubrick, o escritor de Star Wars chegou no nome de John Dykstra, nome importantíssimo para a identidade visual da franquia. Além dele contratar todo o elenco talentoso de artistas visuais, trouxe ideias essenciais como o visual dos sabres de luz.
O próprio vilão mais icônico da ficção científica só existiu por causa dessa colaboração de artistas. George Lucas contratou Ralph McQuarrie para desenhar momentos-chave da história para ajudar no desenvolvimento do filme. A única descrição que o cineasta americano havia dado sobre o personagem era “um homem alto vestindo um robe preto”. A partir disso, McQuarrie criou o visual base do vilão, colocando uma máscara com inspiração nos capacetes utilizados pelo Japão feudal. A partir do desenho, o designer de figurino John Mollo misturou diversos elementos, como roupas de monges e padres com uniformes nazistas para a criação do traje. Por fim, o designer de som Ben Burtt utilizou equipamentos de mergulho para a criação da respiração pesada do personagem.

A idealização e, por fim, a criação de Darth Vader evidenciam o ponto todo desse texto. George Lucas é sim um realizador muito talentoso, mas o talento dele reside principalmente em sua habilidade de colaborar com os outros. Mesmo pensando em uma descrição simples para o antagonista, a partir da colaboração de vários artistas envolvidos de diferentes áreas com diversas especialidades, foi-se possível a criação do maior vilão da história da ficção científica.
Esse caráter colaborativo esteve presente em toda a criação de Star Wars, e foi essencial para a consolidação da franquia no cenário da cultura pop em que ocupa atualmente.
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